Médio Oriente teme efeito do embargo russo de trigo
Carência de cereais pode aumentar o preço do pão, o que provoca tensões sociais
As consequências nefastas dos fogos que assolaram a região de Moscovo vão muito para além das fronteiras russas: alcançam o Médio Oriente e o mercado internacional. Em causa, a decisão do primeiro-ministro Vladimir Putin de proibir a exportação de cereais até ao fim do ano, uma medida que entrou ontem em vigor e poderá prolongar-se até 2011, caso Moscovo o ache necessário.
Terceiro exportador mundial de trigo, cevada e centeio - entre outros cereiais - a Rússia é praticamente o "celeiro" do Médio Oriente, sendo o Egipto o seu principal comprador. Faltando os cereiais russos, o Cairo - como outras capitais da região - terá de se voltar para outros mercados, provavelmente os dos países da União Europeia, para dar resposta às necessidades das suas populações.
Analistas revelam que a decisão russa se prende com o desejo de evitar qualquer risco de conflitos sociais que ocorreriam caso se verificasse um aumento brutal do preço dos alimentos. Aliás, Putin não o escondeu quando, ao anunciar a medida, afirmou: "É preciso impedir a inflação dos preços e salvar também o gado russo" que teria de ser abatido em consequência do aumento do preço dos cereais no mercado interno.
Mas se Putin resolve os seus problemas internos com a proibição temporária das exportações, outros há que veem nela a ameaça de crise dentro das suas fronteiras. Tanto mais que a medida russa já provocou o aumento do preço dos cereais nos mercados internacionais, em especial no americano.
Uma das consequências desta "especulação" será o aumento do preço do pão, medida explosiva em países do Médio Oriente onde grande parte da população subsiste apenas com esse alimento.
O Egipto é um exemplo acabado dessa situação. Aumentar o preço do pão, quando um quinto dos seus 83 milhões de habitantes vive com menos de um dólar por dia - segundo dados das Nações Unidas -, é uma receita certa para o fantasma da fome e a eclosão de violentos conflitos sociais, uma situação que o Cairo quer evitar. Em 2007, quando o preço dos cereais triplicou nos mercados internacionais, o Egipto viu-se forçado a reduzir a quantidade do pão subsidiado. Em consequência, milhares de pessoas entraram em confronto enquanto esperavam junto às padarias públicas para conseguirem pão, várias pessoas morreram e o Presidente Hosni Mubarak utilizou os militares para acabar com o conflito.
"Não temos qualquer intenção de aumentar os preços dos artigos subsidiados", afirmou, há dias, o ministro da Solidariedade Social egípcio, Ali Moseilhi. Tendo em conta que 2011 é ano de eleições presidenciais, é de crer que o Governo tudo fará para não alterar o preço do pão ou arrisca-se a que o candidato do poder - Hosni Mubarak ou o seu filho Gamal - seja derrotado pelo homem forte da oposição, o ex-chefe da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), Mohammed elBaradei.
Entretanto, a Comissão Europeia revelou estar a seguir "atentamente" a evolução da situação dos mercados de cereais e garante estar pronta para, "se necessário", intervir com medidas apropriadas.
"Exportadora líquida" da ordem dos 12 a 20 milhões de toneladas de trigo, a UE, que apenas importava da Rússia uma ínfima parte (entre 0,3 e 0,8 milhões de toneladas), poderá ser um dos mercados privilegiados para os países afectados pela decisão de Moscovo.
fonte: DN
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