sábado, 11 de setembro de 2010

Alcafache: Memórias do 11 de Setembro português


Há 25 anos, num final de tarde quente, chocaram frontalmente na Linha da Beira Alta um Sud-Express com destino a Paris cheio de emigrantes e um Regional que seguia para Coimbra. O número exacto de mortos permanece uma incógnita.

Duarte Correia, hoje com 62 anos, viajava para a Alemanha, onde estava emigrado. Sobretudo desde que deixou de trabalhar, recorda-se constantemente dos momentos que viveu naquele dia.

“Subi em Nelas e, a poucos quilómetros, senti um grande embate. Conforme foi o estrondo muito grande, o lume (começou) logo a arder por baixo da minha carruagem”, recordou à agência Lusa.

Depois de um momento inicial de atordoamento conseguiu reagir e ainda salvou um casal que viajava ao seu lado.

“Abri a janela e atirei o casal para fora. Depois olhei para a linha, havia chapas, molas altas, atirei-me lá para baixo. Fui para ao pé deles e apertaram-me a mão”, acrescentou.

Também Manuel Dias, de 75 anos, ajudou a salvar pessoas, apesar de não viajar em nenhum dos comboios. Estava com um vendedor na sua mercearia, próxima do apeadeiro de Alcafache, quando ouviram “um barulho muito grande”.

“Chegámos à porta e começou-se a ver muito fumo. E depois começaram a vir gritos da passagem de nível. Foi a pessoa que estava lá que notou que tinha havido o acidente”, referiu, contando que rapidamente se deslocaram para o local.

Manuel Dias admite que, no entanto, só teve noção da dimensão da tragédia quando chegou e se deparou com “um inferno”, com umas “carruagens tombadas e outras a arder”.

“Ninguém calculava que aquele comboio (o internacional) trouxesse tanta gente. Quando lá cheguei tudo ardia, a mata envolta e as carruagens. Só se ouviam pessoas a gritar lá dentro, a levantar os braços, queriam sair e as portas não abriam”, recordou.

Augusto Sá já aos nove anos tinha perdido a mãe num acidente rodoviário. A 11 de Setembro de 1985, tinha então 25 anos, foi levar o pai, a madrasta e dois irmãos à estação de Espinho para embarcaram com destino a França.

Permaneceu em Espinho e foi jantar com a namorada a um restaurante, onde ficou a saber da notícia do acidente.

“Um pouco antes do noticiário houve um flash noticioso. Nesse momento não transmitia imagens, mas já se sabia de antemão que se tinha dado um trágico acidente de um comboio de emigrantes”, contou.

Os horários dos comboios não lhe deixaram dúvidas: a sua família poderia estar entre as vítimas.

“O meu pai foi vítima, juntamente com a minha irmã”, referiu, acrescentando que antes de morrer o pai retirou para fora do comboio a mulher, o filho e mais algumas pessoas.

Os corpos do pai e da irmã nunca foram identificados. Augusto Sá supõe que tenham ficado carbonizados ou em cinza na vala comum aberta no local onde hoje existe um memorial de homenagem às vítimas e a todos os que estiveram envolvidos no socorro.


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